Abstract: a arte de criar

O design não é arte, apesar desta fazer parte de seu processo desde o embrião da ideia até sua versão final.

Por Thiago Toledo, aluno do 6º período de Publicidade e Propaganda

A palavra design vem diretamente da língua inglesa e abrange diversas áreas e significados diferentes. O verbo to design, por exemplo, pode ser traduzido como: projetar, desenhar, criar, planejar, designar, entre outros diversos sentidos. A série documental Abstract: the art of design, da Netflix, caminha por este diversificado ecossistema da criatividade.

Em Abstract somos apresentados a um profissional por episódio ao longo de suas duas temporadas, o que torna possível assisti-la sem uma linearidade. Ao mergulharmos no universo particular de cada designer, conhecemos mais sobre suas vidas pessoais, suas histórias, suas inspirações e aspirações. Além de entendermos mais sobre as diferentes áreas criativas abordadas, como o design gráfico e tipográfico, a fotografia, a arquitetura e a cenografia.

Em um dos episódios mais geniais e inspiradores da série, conhecemos Neri Oxman, bioarquiteta e professora do Massachusetts Institute of Technology (MIT). Neri acredita na integração de profissionais de diferentes áreas do conhecimento para criações inovadoras e revolucionárias, uma vez que cada profissional expressa a sua visão de mundo em seus trabalhos, independente da profissão ou área em que atua. Se arriscar em diferentes disciplinas abre novos horizonte para a sua percepção de realidade e é justamente esta combinação de áreas distintas que Neri promove no MIT Media Lab, aliando a biologia, o design e a ciência para criar obras de arte e equipamentos tecnologicamente revolucionários produzidos a partir de matéria orgânica e inofensiva ao meio ambiente.

“Estávamos na escola de design, então tínhamos uma certa permissão. Permissão para ser esquisitos”. A fala é de Nicholas Negroponte, arquiteto e um dos fundadores do MIT Media Lab, em 1985. O laboratório é focado em promover a interação entre ser humano e máquina e já apresentou alguns trabalhos revolucionários que combinam design, ciência e engenharia. Alguns foram vistos como estúpidos ou estranhos na época em que foram apresentados, como a tela plana e a tecnologia touch screen.

Inspirações e referências

Ao contarem sobre o seu passado e suas trajetórias, os designers da série nos ajudam a entender sobre como cada influência e cada estímulo surtiu um efeito em suas vidas e suas carreiras. Neri, por exemplo, é filha de arquitetos, nascida e criada em Haifa, cidade israelense conhecida por sua natureza e estonteantes paisagens. Após servir ao exército de seu país, Oxman iniciou a faculdade de medicina, curso este que ela trocaria por arquitetura após dois anos. Sua paixão pela natureza e pela arquitetura fez com que ela desenvolvesse diversos projetos com a intenção de mudar o mundo para melhor, enquanto ela trabalha com o que mais ama. Um desses projetos é o apiário sintético, onde são simuladas as condições da primavera durante o ano inteiro de forma a combater a diminuição populacional das abelhas.

 

O apiário sintético de Neri Oxman em parceria com o Grupo Mediated Matter.

 

Em Abstract, também conhecemos um pouco sobre o processo criativo de cada designer, como podemos ver no episódio com Jonathan Hoefler, designer tipográfico em seu próprio escritório, a Hoefler&Co. Além de ser o criador de várias famílias tipográficas famosas, como as utilizadas na revista Rolling Stone e no Museu Guggenheim, Hoeffler criou uma das fontes mais famosas e adoradas pelos designers ao redor do mundo, a Gotham. O designer também teve a perspicácia de registrar o domínio typography.com como seu, o que torna o site de sua companhia uma referência global no assunto.

Acompanhamos Hoefler em passeios pelas ruas de Nova York, onde somos cercados por referências visuais para a criação tipográfica. Cartazes, outdoors, placas, pinturas, grafite, tudo enriquece a biblioteca mental do designer enquanto este caminha até o trabalho, mas é nos relógios que ele busca maior inspiração.

Apaixonado por relógios de pulso, Jonathan Hoefler nos explica como os algarismos e os nomes cravados nos acessórios o inspiram na criação de novas famílias tipográficas, como a Decimal, cujo desenvolvimento foi compartilhado conosco ao longo do episódio. A criação tipográfica pode levar de meses a anos, mas a sua utilidade para o mundo criativo transcende qualquer período de desenvolvimento. O trabalho de Hoefler, por exemplo, serviu para a construção de um trabalho histórico de outra grande designer: Paula Scher.

“A cara de Manhattan”

Scher é tida por muitos como a rainha do design gráfico. Atualmente, ela trabalha no estúdio de design Pentagram, em Nova York, e foi a grande responsável pelo rebranding do Teatro Público de Nova York, no qual ela utilizou uma das famílias tipográficas criadas por Hoefler: a Knockout.

 

 

Em seu episódio na série, Paula Scher destrincha vários de seus trabalhos realizados ao longo de sua carreira, além de reportar um acontecimento que nos provoca reflexões quanto a atemporalidade da compulsão humana por copiar o que faz sucesso. Em meados da década de 90, Paula esteve à frente da criação de peças para a divulgação do musical Bring In ‘Da Noise Bring In ‘Da Funk, realizado no mesmo teatro público.

 

Exemplo de peça da campanha.

 

Exemplo de peça da campanha.

 

Por sua identidade única e de fácil ambientação na cidade de Nova York, as peças de divulgação ganharam as ruas da metrópole, dimensionando o tamanho do sucesso do trabalho de Paula. Porém, após 5 anos do lançamento da campanha, a cidade já estava tomada por peças que buscavam emular a estética criada por Paula na tentativa de repetir o sucesso da designer, o que a frustrou profundamente. A sensação era que todas as marcas de Nova York haviam se apoderado da identidade do Teatro Público, movidas pelo desespero de querer um lugar ao Sol. Tornaram um trabalho diferenciado e único em algo padronizado que se via em cada esquina.

Inovação, inspiração e sucesso são apenas alguns dos valores da criatividade abordados pela Netflix em Abstract. A série, além de entreter, abre novas portas para enxergarmos diferentes nuances do nosso mundo com outros olhos e com certeza, independente de área de atuação, merece ser apreciada.



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