Exploração animal em laboratório

Vídeo viraliza na internet e chama atenção para marcas de cosméticos que ainda praticam testes em animais.

Por Guilherme Dias, Lucas Marques e Luiza Maria, alunes de Jornalismo do UniBH

Curta-metragem Salve o Ralph expõe a rotina de um coelho cobaia em testes de cosméticos. Imagem: reprodução.

O curta-metragem “Salve o Ralph” comoveu a internet, em abril deste ano, ao mostrar um personagem, representado por um coelho nomeado como Ralph, apresentando um pouco da sua “rotina de trabalho” para as câmeras.

A ação faz parte da campanha global promovida pela Humane Society International (HSI) para conscientizar e proibir os testes de cosméticos em animais. Ralph é o porta-voz da #SaveRalph, que usa a animação para mostrar a crueldade dos testes e a situação dos animais nos laboratórios em todo o mundo.

No vídeo, dublado pelo ator Rodrigo Santoro na versão em português, Ralph é entrevistado por uma equipe de filmagem para um documentário e apresenta sua rotina diária como “cobaia”. Logo no início, ele já mostra algumas sequelas dos testes a que é submetido: “Eu estou cego no olho direito e essa orelha [direita]… não consigo ouvir nada a não ser zumbido. Meu pelo já foi raspado, tenho queimadura química nas costas”, diz o personagem.

Ralph é submetido a todos os procedimentos demonstrados no vídeo como uma forma de protesto à exploração aos animais indefesos, mas faz um alerta discreto no final: “Só gostaria de dizer a todos que ainda estão comprando cosméticos testados em animais como rímel, shampoo, protetor solar, praticamente tudo que está no seu banheiro, sem vocês e sem países que permitem testes em animais, eu estaria nas ruas, bem, não nas ruas, mas nos campos… como um coelho normal”.

Segundo a HSI, o coelho é o animal que mais sofre com a indústria de cosméticos. Eles são amarrados pelo pescoço, tendo produtos cosméticos e seus ingredientes pingados nos olhos e na pele raspada das costas. Os porquinhos da Índia e ratos também são usados como cobaias, com produtos químicos espalhados nas peles raspadas e nas orelhas. Os animais não recebem alívio da dor e são mortos ao final dos testes.

Empresas expostas

Embora já seja proibida em 40 países, incluindo o Brasil, a prática ainda é regulamentada em lugares como a China, onde os testes em animais são obrigatórios por lei para obter o registro e certificação oficiais da segurança de determinadas categorias de produtos.

Desde que o vídeo saiu, listas com marcas populares e que ainda testam em animais circularam pelas redes sociais. Com isso, foi iniciado um movimento para que esses produtos não sejam mais comprados até que essas marcas tomem uma providência quanto ao assunto.

Publicação da Vegetarianos Online, página com mais de 230 mil seguidores no Instagram. Imagem: reprodução.

No Brasil, estados como o Amazonas, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Pará, Paraná, Pernambuco, Rio de Janeiro e São Paulo já têm leis que proíbem o uso de animais em determinadas indústrias. Para identificar se um produto não faz teste em animais, o indicado é sempre se atentar ao seu rótulo, que deve conter um selo cruelty free.

O vereador de Belo Horizonte, Wanderley Porto (Patriota), é um dos apoiadores desta causa. Relator da Comissão Especial de Defesa Animal, da Câmara Municipal, e responsável pela criação de diversos projetos que visam promover a saúde dos animais, ele afirma que lutar a favor dos animais é respeitar a vida. “Pesquisas comprovam que os animais são seres sencientes. Ou seja, eles são dotados de sentimentos e sensibilidade. Diante disso, é preciso conscientizar que a exploração, o abandono e os maus-tratos são atitudes incompatíveis com o que vivemos atualmente na sociedade”, diz.

A ciência comprova

Cientificamente falando, Wanderley tem razão. Pelo menos é o que diz a Dra Marize Campos Valadares, professora e coordenadora do Laboratório de Toxicologia e Farmacologia Celular LFTC/FarmaTec, da Faculdade de Farmácia da Universidade Federal de Goiás. Segundo ela, além da crueldade que atrai a atenção da sociedade civil, este tipo de experimento pode ser altamente ineficaz. “A eficácia preditiva deste tipo de teste nem sempre é convincente. Afinal, o que é tóxico ou danoso para um animal, nem sempre é para o ser humano. Creio que substituir testes em animais por métodos mais éticos, modernos e menos danosos a estes seres é o caminho natural que a ciência deva trilhar.”

Dentre estes novos métodos citados pela Dra. Marize, está o teste que utiliza uma espécie de membrana vascularizada de ovos galados para analisar se novos cosméticos, como cremes, loções, pomada e rímeis, são tóxicos para, por exemplo, o nosso sistema ocular. “Este tipo de teste funciona basicamente da seguinte maneira: os cosméticos que estão em teste são colocados em contato com a membrana dos ovos galados. Então iremos observar se tal produto causou algum dano neste organismo, como manchas ou sangramentos. Aí sim, tiramos a conclusão se este produto é ou não tóxico para humanos.”

E além da ciência, esferas do poder público também estão se engajando na causa. Com o objetivo de acabar com os testes em animais, o Conselho Nacional de Controle de Experimentação Animal (CONCEA) tem monitorado laboratórios e outras instituições que mantêm ou utilizam animais para fins de ensino ou pesquisa científica. O objetivo é realizar a verificação dos requisitos pré-estipulados para a manipulação das espécies, bem como inspecionar os experimentos feitos nessas instalações.

Mas, embora a pauta esteja ganhando ainda mais força após o curta-metragem “Salve o Ralph” ganhar cada vez mais relevância nas redes sociais, o caminho até a resolução desse problema é longo. Para o vereador Wanderley, algumas ações como a proibição da venda desses produtos no Brasil, além da ampliação do debate em âmbito social, são fundamentais para o avanço da causa. “Essa é uma questão em que precisamos avançar urgentemente, e isso necessita chegar em mais pessoas. Assim, será possível mobilizar a população, o que cria um barulho que torna possível incomodar as instâncias superiores”, conta.

O vereador ainda relata sobre o amplo diálogo que está sendo feito entre o governo municipal e Organizações Não Governamentais sobre o tema. Segundo ele, um abaixo assinado, com o tema “Brasil: sem mais atrasos – proíba cosméticos em animais já” foi criado pela ONG Te Protejo para combater de forma veemente esses experimentos no Brasil. A petição já conta com mais de um milhão de assinaturas.

Conscientização do consumidor

A pauta também é discutida por consumidores que, em pequenas atitudes, buscam mudar o cenário do planeta. Esse é o caso de Gessica Fernanda. A estudante, de 23 anos, aderiu ao veganismo no início de 2020, e um dos motivos foi a imposição humana sobre a natureza. “Decidi me tornar vegana após meus olhos se abrirem para a forma que tratamos os animais, como se fôssemos proprietários, e também pela questão ambiental, que tem sido prejudicada pelas ações egoístas dos seres humanos”. Segundo a estudante, a decisão tem saldo positivo, com uma melhoria na saúde mental e física.

Contrária ao uso de animais para a testes, Gessica conta que evita consumir produtos que comprovadamente fazem uso dessa técnica ou de marcas que ingressaram no mercado vegano visando apenas o lucro. “Eu não compro e nem uso nada que seja de origem ou testado em animais e isso inclui as marcas que chegaram agora pensando só em dinheiro. Quando vou para a casa de algum familiar ou amigo próximo, sempre levo os meus produtos veganos e os incentivo a usarem também, sempre explicando os benefícios que eles trazem”, conta.

A estudante ainda relata que, embora não pareça, é “fácil” encontrar produtos que não são testados em animais. “É extremamente fácil. Os produtos são baratos e muitas vezes a gente mesmo pode fazer em casa, sem nenhum gasto. Algumas marcas que podem ser exemplo são Skala e Salon Line”, revela.

Linha vegana da Salon Line. Imagem: Divulgação


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