De que maneira a desvalorização das disciplinas filosofia e sociologia, no aprendizado pedagógico, impactam na indisciplina social do Brasil? Por que devemos aprender a com a Finlândia?
Por Paulo Alfaro , aluno 8º período de Jornalismo do Unibh
Em 2019, quando o Poder Executivo brasileiro tinha Abraham Weintraub como ministro da Educação, estudava-se no país a descentralização de investimentos nos cursos de filosofia e sociologia em universidades. À época, o presidente Jair Bolsonaro validava a intenção sob justificativa de que tais graduações não geravam “retorno (financeiro) imediato”. Essa desvalorização de dois dos principais campos das ciências humanas, no entanto, não se restringe ao curso superior e carregam longa fragilidade histórica.
No ano de 1971, conteúdos relacionados à filosofia e à sociologia foram banidos do currículo por determinação da ditadura militar, sendo substituídos por educação moral e cívica no ensino médio. Desde aquele momento, estudantes ausentavam-se do aprendizado didático do funcionamento das sociedades humanas e exercício do pensar sob viés crítico.
Assim se alongou até uma oportunidade de regressos, quando em 2001 o Congresso Nacional aprovou a inclusão das duas disciplinas de maneira obrigatória. No entanto, o então presidente, Fernando Henrique Cardoso, vetou o projeto. Foi somente em 2008 que as atividades filosóficas e sociológicas voltaram às escolas, sob sanção do presidente em exercício, José Alencar, à época fazendo jus à sua prerrogativa de vice-presidente na gestão do governo Lula.
Mas não pense que o cenário pró-reflexão foi favorável a partir daquele momento. Para além das intenções de Jair Bolsonaro e seu então ministro de não dar suporte às disciplinas nas faculdades – desejos que não se concretizaram -, o governador do Paraná, Ratinho Jr, anunciou que as aulas de sociologia e filosofia foram reduzidas nas escolas públicas do estado a partir de 2021, justamente 50 anos após a exclusão realizada pelo período autoritário brasileiro. A decisão estimulou professores da rede pública paranaense a criarem um abaixo-assinado para tentar barrar a nova matriz curricular.
Mas, afinal, qual a motivação para tamanho e constante incômodo com tais disciplinas?
Já dizia Paulo Freire: “seria uma atitude ingênua esperar que as classes dominantes desenvolvessem uma forma de educação que proporcionasse às classes dominadas perceber as injustiças sociais de maneira crítica”.
As disciplinas capazes de direcionarem a nossa educação para uma análise crítica do mundo são, sem dúvidas, a filosofia e sociologia. Enquanto esta última possibilita maior compreensão de um bem-estar social e individual, a primeira citada nos permite problematiza-las.
O impacto gerado para a indisciplina social e a Finlândia como modelo a ser seguido
Talvez a pandemia de coronavírus seja capaz de evidenciar a ausência de absorção dessas disciplinas nos cidadãos brasileiros. Em tempos de necessidade do consenso como garantia moral e ética de sobrevivência da nossa sociedade, o individualismo prevaleceu. Nunca o “bem-estar social”, defendido pelas ciências sociais, fez tanto sentido e, ao mesmo tempo, nunca ficou tão escancarada a sua desvalorização enquanto ideal.
De uma perspectiva sociológica, aqui vai mais um paralelo com a pandemia para exemplificar a necessidade de tais aprendizados das ciências humanas em nossas vidas. Governadores e prefeitos no país optaram por implantar políticas promovidas pela ciência a partir do isolamento horizontal. Como resposta científica à descredibilização de instituições sociais por parte de nossa população, o Brasil teve uma taxa de isolamento inferior a 40% contra a Covid-19 no mês de março de 2021, segundo dados do startup In Loco. Isso ocorreu, sobretudo, quando o país vivia (vive) seu pior momento sanitário da história.
O quanto a descrença nas orientações do Estado podem ser consequência da falta de compreender a importância dos institutos sociais – estudo desenvolvido na sociologia?
Para o sociólogo francês, Émile Durkheim (1858-1917), é por meio das instituições sociais que garantimos a ordem da sociedade, no intuito de unir cidadãos em torno de uma formação social. O Estado, como parte das instituições sociais, tem extrema importância no processo de socialização do ser humano, ao assumir papel educativo e atuar na coesão social.
De acordo com o Relatório Mundial da Felicidade, publicado por meio de iniciativa da Rede de Soluções para o Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas, a Finlândia foi um dos países que melhor se adaptou aos desafios do coronavírus. “O fato de confiarmos nas autoridades significa que os finlandeses têm seguido bem as restrições, tornando a Finlândia um dos países menos afetados pela pandemia”, explicou Frank Martela, pesquisador da Universidade de Aalto, na Finlândia, em entrevista à BBC News Mundo.
A credibilização da população finlandesa ao Estado foi um dos pontos cruciais para o país ser eleito – pelo mesmo relatório – o mais feliz do mundo em tempos de pandemia. O exemplo ilustra a importância de confiar nas instituições sociais para um bom enfrentamento ao vírus, e, certamente, o estudo da filosofia e da sociologia são aqueles que mais se aproximam de nos provocar acerca deste assunto.
Na Finlândia, os alunos começaram a aprender filosofia e sociologia, bem como artes e música, aos 7 anos. Em 2013, o país foi líder do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA), ranking internacional de avaliação da educação. À época, a ministra da Educação e Ciência da Finlândia, Krista Kiuru, revelou que o bom nível atingido se deve a uma sociedade que “valoriza a civilização e a educação”, em entrevista ao portal Terra.
Torna-se claro, a partir dos exemplos citados acima, que as ferramentas pedagógicas mais capacitadas em formar pessoas para além da capacidade operacional e técnica são a filosofia e a sociologia, pois são elas as responsáveis por preparar-nos não somente como trabalhadores, mas também como cidadãos, preocupados com o próximo e sob o despertar do pensamento crítico.