Hamilton e a igualdade na Fórmula 1

Heptacampeão mundial conseguiu que a F1 debata e planeje ações de combate à desigualdade e promova a diversidade no meio

Por Paulo Henrique Pereira, aluno do 8º de Jornalismo do UniBH

Nunca se debateu tanto a diversidade e a igualdade na sociedade – a ponto de tal discussão chegar a um espaço em que eu, como fã, jamais os via sendo abordados: a Fórmula 1. Neste esporte de cifras altíssimas, contudo, o debate começou tardiamente, graças a Lewis Hamilton, único piloto negro a disputar uma temporada da F1 e, hoje, seu maior campeão – ao lado de Michael Schumacher – com 7 títulos, mas já em busca do oitavo.

Apoiador da causa antirracista, Hamilton participou das manifestações em Londres contra a morte de George Floyd, no estado do Minneapolis, nos Estados Unidos, em maio do ano passado. Ele ainda destacou que a categoria e os outros pilotos não se posicionavam sobre o racismo. Alguns pilotos o apoiaram, ajoelhando-se, antes do GP da Áustria, etapa de abertura do ano passado. Outros, como Kimi Raikkonen, campeão em 2007, e certos talentos da nova geração, como Max Verstappen e Charles Leclerc, não fizeram o mesmo gesto.

Após os protestos, a Fórmula 1 anunciou a iniciativa We Race As One – ou “Nós corremos como um”, em tradução livre –, com três pilares principais: sustentabilidade, diversidade e igualdade e comunidade. Dentre as ações, há iniciativas como o financiamento de bolsas de estudos para estudantes de engenharia, com passados diversos e pouco privilegiados por oportunidades de trabalhar na Fórmula 1, a implementação de programas de estágio e aprendizagem, com a F1, para grupos sub-representados nas equipes. Por fim, as ações pretendem a redução da quantidade de garrafas plásticas usadas e o desperdício de comida no paddock e pits.

Por meio do We Race As One, outra ação da F1 será a adição da W Series, categoria para mulheres, que estará presente em nove finais de semana, como evento de apoio, realizadas antes das corridas. Permite-se, assim, que elas também estejam dentro do mesmo espaço dos homens, e que revelem como são corajosas e têm capacidade (mental e técnica) para guiar um carro a mais de 300 km/h. Quero prestigiar esse campeonato.

A equipe de Hamilton, Mercedes, também entrou em apoio a seu piloto, e fez algo que, para muitos, inclusive eu, seria inimaginável dentro de um esporte tão elitista. O grupo, simplesmente, trocou a cor de seus carros na temporada 2020, também mantida nesta temporada: saiu o tradicional tom de prata, para entrada do preto. Fica a sugestão: quem quiser dar uma miniatura do W11 preto para mim, aceito com todo o carinho!

“Vamos competir de preto em 2020, como um compromisso público para melhorar a diversidade de nossa equipe. Também é a declaração de que somos contra o racismo e todas as formas de discriminação”, destacou a equipe, em comunicado.

A Mercedes foi além: criou o Accelerate 25, tendo Hamilton como líder. Trata-se de programa que promove o treinamento de recrutadores, gerentes e outros membros contra o preconceito inconsciente, e tem, como principal meta, a contratação de 25% de novos colaboradores provindos das minorias. Amplia-se, assim, a diversidade dentro do time, sendo um legado para a atual heptacampeã de construtores.

A campanha Accelerate 25 será levada no halo dos carros da equipe esse ano – Imagem: Twitter @MercedesAMGF1.

 

Vejo que a F1 tem que estar presente nesse debate sobre a igualdade de gênero e a diversidade. E que sejam feitas ações para promover essas pautas. Em um esporte com alcance de quase dois bilhões de pessoas no mundo pela TV, afora o engajamento de seus seguidores nas redes sociais, tal discussão não existia até o ano o início do campeonato passado.  Também não havia iniciativas para promover uma Fórmula 1 mais igualitária, com pilotos negros ou de origem humilde, além de mulheres no cargo de chefia das equipes – já que Claire Williams saiu do comando da Williams, equipe fundada pelo seu pai e vendida ao fundo Dorliton Capital, após o GP da Itália do ano passado, em enorme sinal de atraso em relação aos tempos.

Se isso ocorresse durante o período de Bernie Ecclestone, antigo chefão da F1, essas iniciativas sequer seriam debatidas ou minimizadas, como declarado por ele em entrevista à CNN americana. Para o ex-poderoso, assuntos como a diversidade seriam, hoje, “moda”, e, “em muitos casos, os negros são mais racistas do que os brancos”. Bernie, porém, foi criticado pela própria categoria, em comunicado: “Os comentários de Bernie não têm espaço na sociedade”.  Hamilton também se pronunciou, no Instagram: “Se alguém que comandou o esporte por décadas tem tamanha falta de empatia pelos problemas fundamentais que nós, pessoas negras, temos de lidar todos os dias, como podemos esperar que todas as pessoas que trabalham para ele compreendam?”.

Essas mudanças que aconteceram na Fórmula 1 são bastante positivas, pois, agora, a categoria mostra que está em sintonia com Hamilton. Está, também, atenta à necessidade de debater e promover ações relacionadas à diminuição das desigualdades e à promoção da diversidade de pessoas. É possível, também, criar um ambiente sustentável dentro do circo da F1. Mas, assim como ele, estou na expectativa de que a F1 e o We Race As One não fiquem apenas nos slogans.

 



0 0 votes
Article Rating
Subscribe
Notify of
guest
0 Comentários
Inline Feedbacks
View all comments