Moda consciente e sustentável: é possível?

Entenda o que está por trás do mundo da moda e como ações conscientes são importantes para o mercado de trabalho e para o meio ambiente. 

Por Marcela Cristina Reis, aluna do 8º período de Jornalismo do UniBH

A moda sustentável visa questionar a produção acelerada (fast fashion), que  incentiva o consumo desenfreado, e a forma de produção da indústria têxtil. Enquanto a moda consciente é quando o consumidor expressa preocupação com as questões ambientais e sociais envolvendo a produção em massa e também questiona o fast fashion. 

O fast fashion (moda rápida) é um modelo de produção em massa em que os produtos  são produzidos de forma rápida, vendidos e descartados de maneira acelerada, seguindo tendências e incentivando o consumo exagerado. As peças geralmente são de baixa qualidade e, consequentemente, os preços também são baixos. Os danos ao meio ambiente têm início desde a sua produção  com o consumo excessivo de água no processo de branqueamento e tingimento dos tecidos ao consumo de energia e poluição do solo, além do grande descarte de roupas, em toneladas, nos aterros sanitários. Além do dano ambiental, o modelo de moda rápida geralmente utiliza mão de obra “duvidosa”. Portanto, se o valor do produto é baixo, utiliza-se de mão de obra barata de trabalhadores que vivem em condições extremamente precárias.

Já o slow fashion (moda lenta) é uma opção para tornar a moda mais sustentável. Geralmente as marcas não seguem tendências e dão preferências à fabricação de peças atemporais que possam resistir à passagem dos anos. Produções artesanais e de produtores locais fazem parte da tentativa de  criar uma moda com mais consciência. Assim, o consumidor tem conhecimento de como a roupa foi produzida e quem produziu. Porém, as fabricantes de moda lenta ainda estão presentes em nicho mais fechado.Como os tecidos são de melhor qualidade e o trabalho é artesanal, os preços costumam ser altos e não conseguem competir com  o fast fashion em relação ao preço. Brechós e customizações também são alternativas sustentáveis e com valores mais acessíveis para um consumo consciente.

Meio Ambiente e mercado de trabalho X Moda?
Uma viagem aos produtores da marca de Bangladesh, fotografada por People Tree

 

É de extrema importância que a sociedade  compreenda o impacto do mundo da moda  no meio ambiente e assim desenvolva um pensamento mais consciente e sustentável para  tentar, através dos  atos de consumo,  reduzir os  danos ambientais. Pensar no impacto social que a indústria têxtil provoca também é uma maneira de pensar na moda sustentável e consciente.

A  indústria têxtil é a segunda que mais polui o meio ambiente, atrás somente do petróleo. A indústria da moda é também o segundo setor que mais explora a mão de obra escrava no mundo.

Trabalho análogo à escravidão ocorre quando a pessoa é submentida a condições degradantes no ambiente de trabalho, como jornadas de trabalho exaustivas, dependência por dívidida que acontece quando o empregador cobra por alimentação e moradia, e quando se encontra em situação de perigo no local de trabalho. 

A adesão do fast fashion ao conceito de moda atual também significa consequências que afetam diretamente as pessoas que fazem parte deste ciclo produtivo. A inclinação para produção acelerada e os custos baixos significam que os empregadores utilizam da mão de obra mais barata dos trabalhadores ao mesmo tempo em que eles produzem mais, criando assim ambientes inadequados onde as  pessoas são submetidas a  viverem em situações extremamente precárias, onde tanto as alimentações quanto as acomodações são descontadas no salário, que já é baixo, tendo em vista a quantidade de horas trabalhadas. 

Algumas grandes marcas varejistas terceirizam a produção de algumas peças e contratam confecções que não conseguem entregar toda a produção a tempo. É nesse momento que as empresas passam o trabalho para pequenas oficinas, que se utilizam da mão de obra escrava para deixar o custo menor e, como consequência, aumentar os lucros. A falta de fiscalização  de tais empresas continua deixando os trabalhadores em situações desumanas.

Outras marcas têm investido em “marketing verde” para mostrar ao público que estão mudando seus meios  de produção para algo mais “consciente”. É  importante que iniciativas das marcas e dos consumidores  se adaptem a uma produção e a um consumo sustentáveis  Porém,  existe também o impacto para pessoas  que vivem na “base” de produção. Qualquer escassez severa de demanda pode ter um enorme impacto nas vidas de trabalhadores braçais. Portanto, é importante não pensar somente no momento do consumo ou depois do consumo, mas repensar esse sistema desde a sua base.

Sustentabilidade é o caminho?

O conceito de sustentabilidade é apresentado como um equilíbrio entre as três áreas de desenvolvimento: social, econômico e ambiental. Além de “deixar de comprar” ou “comprar melhores produtos”, como as ações, tanto do consumidor final quanto das marcas, podem atuar para minimizar esse problema desde a sua base? 

É imprescindível   pensarmos em reduzir os danos causados ao meio ambiente, mas como vamos utilizar dessa inovação para melhorar a vida dos trabalhadores que vivem com o mínimo que a produção em massa oferece? Questionar os poderes públicos seria uma alternativa para colaborar com a “liberdade” e a dignidade dos trabalhadores?   O fato de boicotarmos marcas ou tais  marcas investirem em  marketing voltado para sustentabilidade pode não necessariamente  atingir a base de maneira positiva.

Uma alternativa que   pode colaborar de forma positiva para todos que fazem parte desse processo, desde os produtores de algodão até o consumidor, seria a utilização do fair trade, que significa comércio justo. Segundo a International Federation of Alternative Trade (IFAT), 2001:  “comércio justo é uma parceria comercial, baseada em diálogo, transparência e respeito, que busca maior equidade no comércio internacional. Ele contribui para o desenvolvimento sustentável através de melhores condições de troca e a garantia dos direitos para produtores e trabalhadores marginalizados” O fair trade considera que as pessoas e o meio ambiente são a principal motivação e não o lucro. O objetivo é desenvolver, proteger e acolher as competências tradicionais de pequenos produtores.

Um exemplo de comércio justo é a marca de vestuário People Tree, uma pioneira na moda sustentável e consciente.  As peças são feitas seguindo os padrões éticos e ambientais e sociais do início ao fim. A marca se apresenta como “inovadora e acessível, respeitando as pessoas e o planeta”. Os produtores utilizam de maneiras mais tradicionais para a construção das peças, como tricô, bordado a mão e tecelagem e a empresa gera oportunidades de emprego em áreas rurais, onde o trabalho geralmente é escasso. Os produtores recebem um salário justo pelo trabalho e realizam em suas comunidades, sem necessidade de migrar para outro país. Também utilizam materiais naturais, evitando ao máximo substâncias tóxicas. 

 As  marcas precisam repensar a forma de produção em todo o ciclo de criação do produto. Poderemos, assim, fazer com que a indústria da moda tente reduzir danos desastrosos que se estabelecem atualmente.  Isso só ocorrerá quando as marcas estiverem em um caminho  rumo à conscientização e à valorização do trabalho, à acessibilidade, à sustentabilidade e ao comércio justo.



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