Idealizado para reduzir os erros de arbitragem, VAR e árbitros de vídeo geram acaloradas discussões
Por Ana Carolina Sousa, aluna do 8º período de Jornalismo do UniBH
Quando surgiu a ideia de implantar o VAR (sigla em inglês para Video Assistant Referee – Árbitro Assistente de Vídeo) no futebol, foi informado que a tecnologia serviria para auxiliar os árbitros de campo em situações de erros que mudariam o rumo da partida. Isso me levou a defender seu uso, até porque… qual fã de futebol não quer jogos ou campeonatos mais justos? Porém, não é o que vem acontecendo no futebol brasileiro. Quanto mais utilizado, mais polêmico fica o VAR.
Em 2019, o sistema apareceu pela primeira vez no Campeonato Brasileiro. Na ocasião, foi o protagonista da principal competição do país, sendo bastante criticado por times e torcedores. A falta de preparo dos árbitros de campo e do vídeo era nítida e, apesar das reclamações, eu ainda defendia sua permanência. Afinal, tratava-se do primeiro grande teste. Na próxima temporada, poderia ser diferente. Será, contudo, que foi? Ah! Além disso, a tecnologia também era elogiada por diminuir os erros de arbitragem no futebol.
No entanto, não posso ser hipócrita de falar que o árbitro de vídeo é totalmente injusto. Desde seu uso oficial na Copa do Mundo de 2018, muitas decisões equivocadas dos árbitros de campo foram corrigidas, principalmente, nos lances objetivos, como impedimento, falta dentro ou fora da área, expulsão de jogador errado, bola à frente, ou não, da linha do gol e mão do atacante no instante do gol. A dúvida em relação ao uso da tecnologia diz respeito, em verdade, aos lances interpretativos.
No protocolo do VAR, a filosofia é “mínima interferência, máximo benefício”. Ou seja, deve-se interromper o jogo apenas para corrigir situações claras e óbvias. Então, por que o assistente de vídeo ainda chama o árbitro de campo para ficar mais de dois minutos analisando um lance, se ele tem que ser claro e óbvio? Na partida entre Santos e Flamengo, válida pelo primeiro turno do Brasileirão 2020, o jogo ficou paralisado por onze minutos devido a duas checagens do VAR. O Peixe marcou dois gols, ainda no primeiro tempo, que foram anulados, sendo ambas as jogadas questionáveis.
Minha maior crítica aos episódios de arbitragem vai além da atuação dos árbitros, pois diz respeito à falta de regras esclarecedoras. O foco deste artigo, contudo, é o uso do VAR. No futebol brasileiro, a maioria dos lances são subjetivos, logo, não há erro concreto, porque a regra tem dado margem a interpretações distintas. Nesses lances, a decisão de campo deve ser mantida e, infelizmente, no Brasileirão 2020, ocorreram muitas interferências do assistente de vídeo.
A famosa frase “dois pesos e duas medidas” define essa situação. Lances considerados exatamente iguais, mas em partidas diferentes, têm interpretação e/ou interferência do VAR de forma distintas. Nesse caso, onde está o critério? Por que, no jogo do Bragantino, foi pênalti quando a bola bateu na mão do zagueiro, e a mesma jogada não gerou penalidade no jogo do Ceará? São critérios que faltam tanto à marcação de campo como à análise no vídeo. Os erros não são apenas dos homens diante da tela, mas, também, dos árbitros de campo, que, mesmo ficando três minutos a checar o lance no monitor, sob vários ângulos e em câmera lenta, ainda tomam decisões erradas.
Um exemplo de lances interpretativos, sobre o qual o assistente de vídeo não deveria interferir – mas sempre interfere –, ocorreu no jogo entre Botafogo e Internacional, no último Brasileiro. O time alvinegro ficou bastante irritado e o goleiro Gatito Fernández chegou a chutar a cabine do VAR. Isso porque o Botafogo teve dois gols anulados pelo uso da tecnologia. O primeiro por impedimento e o segundo de forma equivocada, após o árbitro de vídeo assinalou uma falta na origem da jogada, interferindo na interpretação do árbitro de campo, que não considerou o lance faltoso. Em razão disso, faço o seguinte questionamento: Quem apita o jogo?
Erros inaceitáveis
Provas de que as polêmicas no futebol não vão acabar, mesmo com a implantação do VAR, são alguns erros grotescos ocorridos no Campeonato Brasileiro de 2020. Em 2019, deixamos passar falhas de uso da tecnologia por ser novidade, à espera de que, no ano seguinte, tudo fosse melhor. A coisa, porém, piorou.
Não é só bandeirinha que erra na marcação do impedimento. O VAR, também. Ou melhor, o árbitro que opera o VAR. O chefe de arbitragem da CBF, Leonardo Gaciba, admitiu publicamente que, na partida entre Atlético-MG e São Paulo, houve um erro na utilização da linha de impedimento. O jogo ainda estava 0 a 0 quando o atacante do tricolor, Luciano, teve um gol mal anulado pelo árbitro de vídeo, ao traçar as linhas do impedimento (via software) com o frame errado da jogada. Depois disso, como confiar nas marcações dos impedimentos?
E o que fazer quando a tecnologia não funciona? No jogo entre Vasco e Internacional, Rodrigo Dourado marcou um gol em posição duvidosa, mas o lance não foi checado, pois a tecnologia para traçar a linha de impedimento não estava funcionando. O problema de isso acontecer é que, muitas vezes, os bandeirinhas deixam de marcar a irregularidade, contando com a interferência do VAR. Se ele não funciona, gera-se polêmica.
Além disso, recentemente, no Campeonato Paulista 2021, o São Paulo teve outro erro de arbitragem admitido por entidades responsáveis. Desta vez, a Federação Paulista de Futebol (FPF) admitiu que no lance em que Luciano foi derrubado na área, após trombar com o goleiro Giovanni, do Novorizontino, houve penalidade que nem a juíza de campo, Edina Alves, e nem o VAR assinalaram. Como a polêmica pode acabar?
Euforia congelada
Além de não deixar o futebol mais justo, o VAR atrapalhou o melhor momento da partida: O GRITO DE GOL! Aquela festa após a bola na rede está sendo congelada pelas interferências do arbitro de vídeo. Em praticamente todos os lances de gols, todos precisam esperar a checagem de vídeo, mesmo que silenciosamente. O torcedor não sabe mais se grita, dança, pula, joga a camisa para o alto ou apenas espera a confirmação. E quando a checagem demora?
O gol é confirmado, mas a partida logo é reiniciada. Não há mais tempo para festejar. É momento de se concentrar, novamente, no jogo. A euforia, aquele momento de extravasar, se congela. A graça de comemorar o gol vai embora, tanto para o torcedor quanto para o jogador. Quem já foi ao estádio sabe como o clima esquenta quando a bola balança a rede, como a torcida se empolga com o momento, mas, com as verificações, o clima esfria.
A interrupção também congela a euforia do narrador, que deixa a espontaneidade de lado nos lances de gol. Muitos, agora, esperam a confirmação da bola na rede, para, só então, gritar! Não que eu ache errado a interferência, ainda mais se correta, mas é preciso melhorar as checagens, realizá-las com rapidez, para que o melhor momento do futebol não fique chato.
Por fim, gostaria de esclarecer que os erros não estão na tecnologia, apesar de não ser 100% confiável, mas, sim, em quem opera o VAR e nos árbitros de campo. É fato que a tecnologia, se bem empregada, ajuda muito a diminuição de erros. O que falta no futebol brasileiro é melhorar a preparação das equipes de arbitragem. Apenas quando pararem as polêmicas, e o árbitro de vídeo deixar de se tornar protagonista das rodadas, é que a implantação do VAR, no futebol brasileiro, terá valido a pena.