O ecossistema da desinformação cresce a cada dia e combater seus efeitos e os conteúdos enganosos torna-se cada vez mais difícil.
Por Iris Aguiar, aluna de Jornalismo do UniBH
“Uma mentira pode viajar meio mundo enquanto a verdade ainda está calçando seus sapatos”- Mark Twain
A desinformação é um processo bem estruturado que recorre a várias ferramentas para fazer com que as pessoas acreditem em determinados fatos e narrativas. Atualmente, a informação e a desinformação parecem disputar uma corrida. Neste embate, a informação está perdendo.
Segundo a diretora da First Draft, projeto de luta contra a desinformação e a desinformação online, Claire Wardle, os agentes da desinformação estão mudando suas táticas para que suas publicações tenham relevância e possam ser entregues a mais pessoas. Existem menos informações falsas e muito mais conteúdos enganosos circulando nas redes.
A desinformação pode ser criada e espalhada de diversas maneiras. É comum, por exemplo, o uso de informações verdadeiras fora de contexto e a manipulação de bancos de dados. Outra maneira é o uso de perguntas para disseminar palavras-chave que levam a conteúdos falsos. Os relatos em 1º pessoa também corroboram para esse ecossistema, já que essas narrativas, normalmente, não são passíveis de confirmar veracidade e entram em outro assunto complexo: a liberdade de expressão.
Essas diversas maneiras de espalhar a desinformação criaram um ecossistema em que as pessoas sentem-se informadas e detentoras da verdade, bem como participantes desse processo de criação de “informações”. Tal fator reforça o sentimento de que elas estão sendo ouvidas e têm lugar de fala, algo que nas mídias tradicionais nem sempre é possível.
Sérgio Lüdtke, editor do projeto Comprova, explica que a desinformação utiliza a emoção para despertar sentimentos como medo e indignação nas pessoas, além de promover ações para que tais pessoas sintam a necessidade de compartilhar os conteúdos.
Os conteúdos criados e disseminados se movem em ondas e costumam seguir a agenda pública. São enganosos, porém sofisticados, devido ao aspecto profissional, e simples, por apresentar uma linguagem de fácil entendimento. A mentira pode se dar por sugestão.
Porque as pessoas acreditam?
É importante entender porque as pessoas são levadas a acreditar em desinformação antes de se preocupar em como desmentir e combater este processo.
A jornalista Taís Seibt, professora e criadora da iniciativa A Fonte Jornalismo de Dados, explica que não ridicularizar e buscar compreender porque a pessoa acredita no que acredita é um primeiro caminho para o diálogo.
Fazer perguntas sobre aquele conteúdo e se apoiar em fatos simples pode ser um passo importante para gerar autorreflexão nas pessoas. Dar tempo para processar as novas informações também é fundamental.
O maior desafio para superar a desinformação é a crença. Muitos agentes de desinformação acreditam que aquele conteúdo é verdadeiro, mas também existem os que procuram manipular e provocar certas pessoas por razões financeiras ou políticas.
Tais Seibt afirma que, quanto mais o interlocutor estiver convencido e envolvido emocionalmente com uma narrativa, mais difícil será que os fatos convençam do contrário. Isso acontece porque negar o que a pessoa acredita também pode ser considerado um argumento para dizer que tudo isso faz parte de uma conspiração.
É mais fácil acreditar no que corrobora com suas crenças e desperta sentimentos mais vívidos, e por isso o uso do apelo emocional ou de experiências pessoais para construir narrativas de desinformação são táticas muito usadas pelos agentes da desinformação. Esta utilização se dá para comprovar que o que estão dizendo é verdade e conquistar seguidores, ao trazer histórias que despertam medo, raiva, paixão e empatia.
O que os jornalistas (e o cidadão) podem fazer?
“A desinformação pode matar”. É o que afirma Patrícia Campos Mello, repórter da Folha de São Paulo, que destaca que em algumas situações a divulgação de conteúdos falsos pode levar a cenários mais sérios, como o contexto atual da pandemia, em que a desinformação levou milhares de pessoas a se exporem a infecções ao acreditarem que o uso de medicamentos específicos poderiam curar a Covid-19.
Os jornalistas, e todo cidadão interessado, podem identificar a desinformação e ajudar a propagar conteúdos de qualidade e desbancar os falsos. Sérgio Lüdtke enfatiza que o jornalismo não deve amplificar a desinformação, logo, é preciso ter cuidado para não fazer viralizar um conteúdo enganoso que antes não havia conseguido gerar impacto ou visualizações.
O jornalismo pode ajudar produzindo conteúdos que apoiem a construção de diálogos e que ensine como identificar narrativas enganosas. Transparência no método jornalístico é essencial para passar credibilidade aos leitores, que assim podem entender como o conteúdo foi feito e apurado.
Boa parte dos leitores só leem as manchetes, não chegam a ver conteúdo total em seu contexto real.Desse modo, é incontestável a necessidade de, ao publicar uma notícia, ter atenção na criação de um título, para que ele não seja usado fora de contexto ou reproduza uma informação falsa.
Iniciativas no Brasil
No Brasil, existem agências de checagem de fatos e narrativas, que trabalham apurando a veracidade dos principais assuntos que circulam nas redes. Veja o site de algumas delas.