Devido à pandemia da Covid-19, SUS realizou mais de 5,7 milhões de consultas online em 2020.
Por Hiago Soares, Karen Moreira, Napáuria Almeida e Thayane Domingos, alunes de Jornalismo do UniBH
Tecnologia e saúde andam de mãos dadas. Cada vez mais a ciência conta com recursos tecnológicos para inovar, realizar tratamentos e fazer descobertas que salvam milhares de vidas. Seja com instrumentos de última geração ou com simples aparelhos telefônicos, computadores e wi-fi, os dois mundos se conectam e trazem novas perspectivas ao mercado.
Uma plataforma de extração de petróleo é, por natureza, um local de difícil acesso quando se trata de oferecer algum serviço de saúde, como um diagnóstico ou atendimento médico imediato. Normalmente, quando uma situação de risco acaba envolvendo os trabalhadores em algum acidente, equipes médicas são enviadas através de transporte aéreo ou são incorporadas ao grupo de trabalho da plataforma para que possam prestar o socorro necessário. Com o uso da tecnologia, porém, os mesmos serviços iniciais podem ser oferecidos com maior rapidez e sem a necessidade de médicos e equipamentos especializados a bordo.
Foi o que constatou uma pesquisa conduzida pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), que procurou analisar, a partir de uma experiência aplicada pelo Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo, com as petrolíferas, a eficiência e a eficácia das inovações em telemedicina nas práticas hospitalares. De acordo com o estudo, o uso de tecnologias como videoconferências, sistemas de informação que unificam dados pessoais e de intervenções médicas dos pacientes, robôs que realizam procedimentos cirúrgicos, além das tecnologias de obtenção, a distância, de imagens e testes de tecido, sangue, urina, dentre outros, começam a provocar mudanças nos modelos de prestação de serviços na área da saúde.
Mais do que oferecer uma alternativa ao atendimento presencial e possibilitar a interação entre médicos e pacientes em regiões distantes ou em locais de difícil acesso, a tecnologia facilita o acompanhamento dos resultados de exames. Os pedidos e realização de testes, que antes eram fragmentados em uma cadeia de empresas e fornecedores, podem agora ser realizados pelo próprio hospital, com as ferramentas inteligentes e adequadas. Por fim, o acesso aos resultados e o acompanhamento do diagnóstico do paciente podem ser feitos virtualmente, o que impacta na redução dos custos envolvidos tanto para a instituição quanto para quem demanda o atendimento.
É o que também pode ser observado em estudo da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) sobre o rastreio de cegueira causada pela diabetes, em que se observou que o uso da telemedicina como estratégia adotada pelo Sistema Único de Saúde (SUS) tornou os procedimentos 94% mais baratos para os cofres públicos. Nesses casos, o uso da tecnologia para diagnósticos precoces a distância evita que pacientes cheguem à consulta presencial com quadro clínico grave, com pouca capacidade de melhora e controle. Como consequência, até mesmo o uso do transporte, como os veículos públicos de um pronto-atendimento, para deslocamento de pacientes em tratamento entre uma cidade e outra, ou entre clínicas dentro do próprio município, acaba diminuindo, impactando no orçamento da cidade.
Segundo a mesma pesquisa da UFMG, as consultas online têm aumentado nos últimos meses devido à necessidade gerada pelo distanciamento social causado pela pandemia do novo coronavírus. Em 2020, com a grande demanda pelo atendimento remoto, a nutricionista Janaina Rungue se viu desafiada a reorganizar a sua agenda. Pesquisou e adotou em sua nova rotina alguns aplicativos e plataformas que possibilitam realizar o acompanhamento global dos seus pacientes de maneira remota. “Foi desafiador, mas percebi que precisava avançar neste sentido para conseguir atender aos pacientes que procuravam pelas consultas online. Com pouco tempo, percebi que essa modalidade era eficiente, prática e totalmente possível”, afirma.
Atualmente, ela realiza cerca de 20 atendimentos online por semana. O valor da consulta é de R$70. Quando o atendimento era presencial, o preço era um pouco maior. “Nós tínhamos que considerar, no preço final da consulta, os custos para manter um consultório, como o aluguel, a água, a luz, o telefone e a internet. Hoje, não tenho mais esses gastos, pois atendo na minha casa ou na casa do paciente”, explica. Ainda segundo ela, outro ponto positivo é que a sua cartela de clientes aumentou cerca de 30%. Pacientes que, mesmo tendo um plano de saúde, optaram por pagar a consulta particular para ter facilidades como horário flexível, nenhum custo com deslocamento e a praticidade de ser atendido em qualquer lugar.
Este é o caso de Aline Melo. A terapeuta ocupacional tem 25 anos e decidiu investir em uma alimentação mais equilibrada para ter uma melhor qualidade de vida. Após uma indicação, optou pelas consultas online e, segundo ela, não há do que se queixar. “Estou tendo uma boa experiência. Acredito que, por estar dentro da minha casa, me deixa mais à vontade e me vem à memória mais fácil as minhas refeições. Além disso, me sinto super segura com a abordagem dela [da nutricionista] – é atenciosa, escuta as nossas queixas, passa confiança e sua conduta é assertiva, além da flexibilidade e do preço”, garante. A experiência tem sido tão positiva que, além da nutricionista, ela também é atendida pela psicóloga de forma remota.
Atendimento Humanizado
A tecnologia é uma parceira importante para o avanço da medicina, mas ela não substitui o trato humano, como o cuidado e a sensibilidade. A humanização começa desde o primeiro contato, quando o paciente precisa de uma informação. É a partir daí que ele começa a ser bem ouvido, ou não.
A tela impõe uma barreira física entre o profissional e o paciente. A princípio, este seria o maior desafio na humanização, mas, para alcançar este objetivo, o profissional pode lançar mão de técnicas que fazem com que a consulta foque na escuta do paciente. Este foi o recurso utilizado pela psicóloga Cristiane Moreira, que também aderiu ao atendimento online nos últimos meses. Ela explica que, visando a qualidade dos atendimentos, precisou se capacitar com a realização de cursos e contou também com o apoio de outros profissionais que já realizavam consultas online. “No presencial, a gente consegue sentir, por exemplo, até a questão da ansiedade na fala da pessoa de uma forma mais concreta, por ela estar ali na nossa frente. Os movimentos, os gestos de pernas, de braços, enfim, muita coisa que a gente avalia com o olhar mesmo”, comenta.
A psicóloga reforça que o teleatendimento tem feito com que ela melhore também como profissional. “Esta forma de trabalho me fez crescer muito enquanto psicóloga, pois tenho conseguido passar para as pessoas uma resiliência que a gente tem que encontrar nesse momento para lidar com tudo isso que está acontecendo”, destaca.
O atendimento humanizado faz com que a queixa do indivíduo seja tratada com respeito e empatia, fazendo toda a diferença na condução do tratamento.
Regulamentação do atendimento online
Em março de 2020, o Conselho Federal de Medicina (CFM) remeteu ao Ministério da Saúde um comunicado sobre a decisão de reconhecer a necessidade e autorizar a prática do atendimento remoto, respeitando as diretrizes da entidade. No dia 15 de abril de 2020, o Governo Federal publicou a Lei 13.989, que dispõe sobre o uso da telemedicina durante a crise causada pelo coronavírus.
As operadoras de saúde precisaram se adequar à nova realidade. Até então, a prática de consultas online, apesar de já ser liberada pelos órgãos responsáveis sob diretrizes específicas, ainda não estava consolidada no mercado, à exceção de alguns hospitais, como o Sírio Libanês e Albert Einstein, em São Paulo.
Em Minas Gerais, a Unimed BH, uma das principais operadoras do estado, ofereceu a modalidade de consulta online para seus clientes e cedeu o seu sistema para a Prefeitura de Belo Horizonte que, por meio da Secretaria Municipal de Saúde, também passou a oferecer o serviço para os usuários do Sistema Único de Saúde (SUS) da capital mineira.
O superintendente de Provimento em Saúde da Central Nacional Unimed, Daniel Albuquerque, reforça a importância do recurso. “Estamos usando a telemedicina como grande aliada, nas suas diferentes modalidades: teleorientação, teletriagem, telemonitoramento e teleconsulta. Juntas, elas colaboram para a coordenação do cuidado e a garantia do acesso, fundamentais para um sistema equalizado”, disse.
A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) ressalta que, independentemente do método e tipo de tecnologia utilizados, as operadoras de saúde devem observar a segurança e a privacidade dos dados de saúde dos beneficiários. Segundo a agência, essas são informações protegidas por legislação especial.
Tecnologia no SUS
O atendimento online também está auxiliando a população que não tem condição para pagar planos de saúde. O Ministério da Saúde criou uma plataforma, o TeleSUS, que ajuda no combate à Covid-19 com consultas virtuais. No ano passado, mais de 5,7 milhões de pessoas já buscaram os serviços do TeleSUS, diz o Ministério da Saúde. O caminho de acesso passa, em todas as etapas, por tecnologias já consolidadas na sociedade. O cidadão pode acionar o Disque Saúde – 136. Também é possível acessá-lo pelo site do Ministério da Saúde, por meio do chat disponível na página, ou pelo aplicativo Coronavírus SUS.